A coluna dessa semana deveria ser sobre a crise de reputação que envolve a Boeing desde o ano passado. As informações já estavam separadas e eu começava a esboçar as primeiras linhas quando o jogador Neymar Jr. monopolizou o noticiário com o escândalo envolvendo denúncias graves de estupro e violência contra mulher. Me perguntei: vale a pena entrar nesse terreno pantanoso e tentar extrair alguma lição a partir dos fatos que se tornaram públicos?
Entendi que a Boeing poderia esperar e que, sim, há o que aprender nesse mais novo escândalo envolvendo uma celebridade do esporte. Mike Tyson, Robinho, Cristiano Ronaldo e tantos outros já estiveram em situações parecidas como a de Neymar e administraram, bem ou mal, o impacto do escândalo sobre suas carreiras.
Não pretendo discutir aqui a possível culpa do jogador ou de quem o acusa, ou a relevante questão de como a mulher é vista nesse tipo de denúncia e, nem mesmo, as tantas teorias da conspiração que circulam pelas redes. Me interessa refletir, sim, como Neymar potencializou a própria crise com uma estratégia de comunicação mal sucedida.
Escolhendo falar diretamente para seus fãs e seguidores pelo seu perfil do Instagram e por meio de um vídeo, o jogador mostra que compreende o novo ambiente midiático que não requer mais as tradicionais notas de esclarecimento e/ou comunicados emitidos exclusivamente para a imprensa. Ate aí, tudo certo. Os equívocos estão fortemente centrados no conteúdo da mensagem que ele pretende passar. É nesse ponto que se concentram os erros do craque das polêmicas. São, pelo menos, cinco equívocos que geraram a recorrente pergunta: ele não é assessorado por bons profissionais da área jurídica e da comunicação, que deveriam estar trabalhando juntos nesse momento? Difícil responder. Difícil, inclusive, saber se esses profissionais são devidamente ouvidos e respeitados na gestão da carreira do jogador.
Mas vamos aos cinco equívocos de Neymar:
- O vídeo é longo e confuso – em sete minutos de um conteúdo pouco claro sem objetividade, com frases e ideias repetidas de forma desencontradas, o vídeo não ajuda o internauta a construir uma linha de raciocínio favorável ao jogador.
- O jogador se vitimiza – recentemente, a Livraria Cultura e a LojaTrês tentaram usar o artifício da vitimização, dizendo que estavam tristes com a repercussão dos fatos, que se sentiam injustiçados e etc etc. Não dá certo. O público quer um posicionamento seguro e contundente e não lamentos de celebridades ou de marcas que apareçam choramingando. Não vale a pena.
- Não há pedido de desculpas aos torcedores e fãs – Os seguidores de Neymar, o seu time e os torcedores, a família dele e os amigos, a seleção brasileira. Era fundamental que ele pedisse desculpas por estar sendo tema de uma discussão que não envolve futebol. Deveria se mostrar arrependido por não conseguir gerenciar sua vida pessoal e ter entrado no meio dessa polêmica. Pedir desculpas é imprescindível. O não reconhecimento de atitudes erradas é visto como arrogância de quem se sente acima do bem e do mal.
- Ele não nega de forma contundente o ocorrido e não esclarece as acusações – Lamentos e vitimização não respondem o que as pessoas querem saber. As acusações precisam ser negadas de forma contundente para que as pessoas acreditem na inocência do jogador. É óbvio que não se pode mentir nesse caso. Fugir do assunto com sete minutos de blá, blá, blá não vai servir como esclarecimento.
- Ao se defender, comete um crime e expõe imagem do próprio filho – Confiante que estará protegido pela condição de celebridade, o jogador comete o crime de expor fotos íntimas sem consentimento da autora das denúncias ao apresentar um feed de conversas que só interessaria à polícia. Gera conteúdo para memes, alimenta a polêmica nas redes sociais, pune a possível vítima e, ainda, o que é péssimo, deixa a foto do filho como fundo de tela, associando a imagem da criança a uma troca de mensagens muito questionável.
Certamente, a crise ganhou força e contornos ainda maiores, tornando-se assunto nacional e internacional, após o vídeo produzido e divulgado pela própria equipe do jogador. Não tem assessoria? Tem, certamente tem, mas na visão mais tradicional da gestão das crises, essa comunicação “sincera” seria suficiente.
Entretanto, o mundo mudou e a fama, o dinheiro e o poder já não resolvem todos os problemas, especialmente, quando o assunto é reputação. As celebridades, assim como as marcas e empresas, precisam ter planejamentos muito mais estratégicos para esses momentos que inevitavelmente acontecerão.
No tempo em que vivemos, em que o tribunal da internet é impiedoso e as causas sociais fontes de muita controvérsia, entre elas, o papel da mulher, é preciso ter política previamente definida para cada palavra que será pronunciada, assim como conteúdos que levem em conta todo o cenário social no qual o evento crítico está inserido.